quinta-feira, 24 de maio de 2007

Batismo de Sangue e Zuzu Angel: antagonismos no contemporâneo "Cinema de Chumbo"





Amigos, tive a oportunidade de assistir ao filme "Batismo de Sangue", baseado em livro homônimo de Frei Betto, um dos frades dominicanos envolvidos com a esquerda armada que combatia o regime militar nacional - alinhados principalmente com o famoso guerrilheiro urbano Carlos Marighela.


Acompanhado de minha namorada, Juliana (que levantou a questão em um comentário sobre o filme), tive a oportunidade de assistir a um filme, diria, maduro. Diferentemente de filmes como "Zuzu Angel" que se perdeu por completo (quem não conhecia, a fundo, a história real da estilista que tivera seu filho Stuart Angel Jones morto por homens da aeronáutica e sua luta pela procura pelo corpo do rapaz, realmente não conseguiria e não conseguiu compreender nada do filme, muito confuso e sem roteiro digno) este filme do diretor Ratón é uma maneira elucidativa de mostrar como se fazer uma filmagem de cunho quase pedagógico, resgatando a história do país, preservando a memória mesmo quando vinculada aos duros anos de chumbo.


O perigo que pressinto (ultrapassando a análise de Batismo de Sangue) é a formação de um novo gênero de filmes nacionais, ditos "Passados durante a Ditadura Militar". Creio que há uma certa catarse nacional sobre os eventos históricos ocorridos nos 21 anos de governos militares, porém muitos se mostram sobre uma única perspectiva, maniqueísta, esquecendo a necessária e comprometida contextualização que reunia radicalidade e ideologização entremeados por um mundo dividido pela Guerra Fria comandada por soviéticos e norte-americanos. Ou seja, nem militares, nem guerrilheiros de esquerda eram bandidos ou mocinhos, e alguns destes filmes colocam a história do país sobre esta perspectiva ficcional, um tanto pobre e simplista. O que se colidiram nestes 21 anos foram dois pensamentos e modelos de sociedade, visões de mundo, ideais e valores diametralmente opostos e o resultado não poderia ser outro: sangue, e de ambos os lados. O que não justifica nem as torturas via órgãos institucionais e até não-institucionais, como DOPS e DOI-CODIS afora, e nem as ditas expropriações e seqüestros surgidos em todo o país - e assim, ambos cometeram crimes, de natureza diferente, mas cometeram crimes sim.


Contudo é bom mostrar ao país os crimes cometidos contra a vida humana, até porque muitas violências contra a condição humana ainda são cometidos neste país, como a tortura que ainda persiste, não como instrumento institucional, mas como recurso de uma sociedade marcada por desigualdades e preconceitos sócio-raciais mal resolvidos.


Assistam a "Batismo de Sangue", garanto ser um bom e inteligente programa. Cinema que faz refletir a história do país, que faz pensar - difícil nos dias de hoje. Não há como não se sensibilizar especialmente com a trajetória do frade dominicano Tito, que após sessões múltiplas de tortura nas mãos do delegado Sérgio Paranhos Fleury (magnificamente interpretado por Cássio Gabus) entra num processo de esquizofrenia e surtos psicóticos, levando-o ao suicídio já em seu exílio parisiense (libertado como moeda de troca durante um dos seqüestros da guerrilha nacional).


De mesmo modo, concluo afirmando o contrário sobre o filme "Zuzu Angel" - se for historiador ou formando em algumas das ciências humanas, assista mesmo que para criticá-lo como aqui faço, caso contrário não se arrisquem, pois correrão o risco de passar algumas horas diante de um roteiro tão mal coligado quanto o blockbuster Homem-Aranha 3.


Abraços Liberais a todos.






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